domingo, 27 de junho de 2010

Para um amor de tantas rugas .

E a família Medeiros se reunia mais uma vez para um almoço rotineiro de domingo, Seu Pedro já com os seus 83 anos, sai do quarto e já escuta a barulheira dos netos que brincavam com o novo Playstation , ele olha para mesa já posta, e com uma expressão irônica pensa : "Hum, frango assado com salada de batata, de novo, que delícia!" até que tentou se acomodar na velha poltrona da sala para interagir com os netos, em vão, já não era respeitado pela nova geração, foi para cozinha oferecer ajuda para suas 3 filhas que brigavam para provar quem era a mais prendada da família, e foi ignorado mais uma vez. Olhou para a garagem e seu único filho lavava o carro, se aproximou, mas a barulheira eletrônica do carro o afastou rapidamente.

Decidiu ir para o seu velho escritório, sentou na cadeira de couro antigo, olhando para os porta retratos que exibiam toda a sua vida em cima da estante, mas seus olhos estavam caídos de desapontamento, não sabia bem se era essa vida que ele sempre sonhou, abriu a gaveta, em busca dos seus óculos, apalpou toda a gaveta, o que fez com a escrivaninha balançasse e sua pasta de documentos foi ao chão. Resmungou bastante antes de se abaixar para resgatar a pasta, mas um papel ficou no chão, amarelado e levemente rasgado, Seu Pedro abriu-o delicadamente, era uma foto de uma namorada da juventude, Marília Bastos, como era ela linda! um simples sorriso tomou conta de seu semblante ao lembrar de como era o namoro dos dois, as brincadeiras, os amassos escondidos, as juras de amor eterno, era lamentável que Pedro tivesse sido chamado para a guerra, por isso foi obrigado a fazer as malas, para a alegria do pai de Marília que há tempos se irritava com o namoro. E o destino se encarregou de afasta-los.

O rosto de sua falecida esposa veio imediatamente em sua mente, disse em voz alta "Meu bem, você foi ótima, mas já faz tanto tempo, desculpe". Neste momento, teve uma idéia ousada, pegou a lista telefônica e procurou o telefone do seu antigo amor, achou! que rápido, seus dedos deslizavam no teclado do telefone,alô?! se identificou,que surpresa! ela disse, propôs que almoçassem juntos, mas aonde? o nervosismo tomou conta, seu coração palpitava depressa, suas mãos suavam, no restaurante principal do Hotel Goldfield! Ok! te encontro em 30min.

Colocou sua melhor camisa, com seu suspensório favorito, sem luxo, mas se perfumou, olhou para o espelho lamentando sua saliente barriga e se admirando na rapidez em que seu cabelo caiu nos últimos anos, ou décadas. . . cacetada! tô atrasado!

Passou pela cozinha, comunicou a família que iria sair, todos se admiraram com a atitude do vô Pedro, mas nínguem se manifestou contra. Pegou um taxi, e foi para o Hotel, pediu a mesa com vista para o cais, colocou uma tulipa rosa em cima do guardanapo. Dona Marília entrou no salão do hotel, e os olhos de seu Pedro se encantavam, e ele se admirou com sua beleza ainda intacta, com algumas rugas a mais, mas com certeza ela ainda era a mais bela de todo o hotel, veio andando devagarzinho com um sorriso saudoso nos lábios.

Ela se sentou, e os dois ficaram horas conversando sobre a vida, e o que cada um tinha feito ao longo desses anos, ela , uma enfermeira aposentada, com 3 filhos, e uma neta, e havia se casado com um importante advogado. Ele, contou que tinha dado baixa no exército há poucos anos e que ainda não se acostumara com o tanto tempo livre. Os dois gargalhavam juntos, se lembrando de tudo que aconteceu,e como se divertiam juntos! o tempo parou, até que o garçom veio até o casal e os comunicou que o restaurante estava fechando, Pedro olhou Marília, e perguntou:
-Meu bem, me perdoa a ousadia, com todo o respeito que tenho por você, quero te perguntar se seria possível se alugássemos um quarto aqui no hotel, apenas para continuarmos conversando?

Ela abriu os olhos, enrugou as sobrancelhas, e depois aliviou a face e disse sorrindo:
-Já não há nada a temer não é mesmo?

E assim se fez, alugaram uma suite, e sentados na cama conversaram, conversaram durante quase a noite toda, riram até a barriga doer. Até que eles começaram a ouvir um som que vinha do outro lado da rua, de um barzinho, Marília entusiasmada falou:
- Pedroca! é a nossa música que tá tocando!!!

e os dois disseram ao mesmo tempo:

-Dama das Camélias, de Francisco Alves!!!!

Como se já tivessem os passos ensaiados, dançaram rodeando todo o quarto, e seus olhos não se desgrudavam, a dança mais parecia uma máquina do tempo! e estavam de volta a 1940, onde dançavam no coreto azul, e . . .

-FOGO!!! SAIAM IMEDIATAMENTE DO QUARTO! ABRAM A PORTA! FOGO, O HOTEL TÁ PEGANDO FOGO!

o funcionário do hotel esmurrava a porta enquanto berrava para que eles abrissem a porta.
Marília olhou para seu amado e exclamou:
-Não quero que esse sonho acabe, por trás dessa porta existe uma vida longe de você! e uma realidade que nossas famílias jamais entenderão.

Ele limpou a lágrima que corria pelo rosto dela, a beijou saudosamente frente às lembranças do passado, e falou:

- Eu sei que nosso fim já vai chegar, mas deixa o moço bater, cansei de viver sem você.

Eles se abraçaram, e continuaram dançando como se não se importassem que a música já tinha acabado.

Com a cabeça no ombro de Pedro, Marília cochichou : "Me abraça forte agora?"



Baseado em fatos reais,
Retratado na música "Conversa de botas batidas"( Marcelo Camelo) - Los Hermanos.

9 comentários:

  1. Nossa! Essa história começou com um tom tão triste que eu cheguei a pensar 'Anem... a Amanda escreveu coisa triste de novo...' mas, como sempre vc me surpreende... Que final lindo! Quem dera ter um final tão sereno como esse... pena que a família do Vô Pedro não entenderia... e outra, essa música é linda demais! Assim como vc!

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  2. Ah neim que depressao amiga, todo mundo tem que morre no final dos teus textos =( e eu fico aqui chrando. Mas a historia é linda *-*, voce escreve cada vez melhor ;*

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  3. muito bom! eu amo essa músicaa!

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  4. los hermanoss.. UhullL..
    muito bommmmmm! parabéns

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  5. Olá moça, como vai? gostei muito da historia, pois bem, vida, vida... acabo de me formar em administração, agora parto para os estudos em Direito... vida, vida...

    Reflexões devido ao texto... difícil saber o que queremos na verdade, amores, carreiras.


    vida, vida.
    ps. sou goiano, morei em Fortaleza e agora moro em Brasilia.
    fiz seus percurso ao contrario...

    abraços carinhosos

    Diego Girão.

    diegogirao@hotmail.com

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  6. Nossa, guria... Que coisa mais linda você dividiu conosco... Obrigada...

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  7. Parabéns, Amanda!!!
    Beijo maior do mundo e vai firme.

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  8. Nossa menina. chorei aqui q isso coisa mais linda ='/

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  9. Amanda,
    seu talento continua sendo: nos surpreender!!
    Parabéns por mais um texto brilhante...
    Conheço uma história muito parecida... mas o final é bem feliz: eles estão juntos: Marlene & amado,
    depois de quase 40 anos.
    Te amo filhota.
    Beijo de mãe.

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